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Desespero, incerteza, humilhação e alívio

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As quatro sensações do título, nessa ordem, descrevem fidedignamente os minutos finais vividos por mim e por milhares de rubro-negros que lotaram as arquibancadas do Manoel Barradas na tarde do último domingo (3), quando o Vitória enfrentou o Flamengo pela última rodada do Brasileirão, precisando apenas de um triunfo simples para garantir, sem sustos, sua permanência na primeira divisão do Campeonato Brasileiro em 2018.

A história do jogo creio que vocês, leitores, já conheçam. Torcida presente em peso, engarrafamento, confusão para entrar, pra comer, pra beber, pra mijar, até mesmo para encontrar um lugar e assistir um Vitória ativo, que trocou passes, pressionou o forte time do Flamengo – que ali buscava três pontos para carimbar o passaporte à Taça Libertadores de 2018 – e balançou as redes aos 40′ do primeiro tempo, com toda frieza, experiência e categoria do contestado Carlos Eduardo, hoje já cotado à renovação, 10 e faixa.

A partir daqui o que descrevo é uma experiência pessoal, que sem dúvidas será semelhante a de quem esteve no mesmo local, na mesma data e horário. Domingo, 03 de dezembro de 2017, 17h30. Estádio Manoel Barradas, Salvador, Brasil. Drible de Vinícius Júnior pra cima de Caíque Sá, passe pro meio da área, domínio e ajeitada de Willian Arão, gol de Rafael Vaz. Era o empate, aos 30 do segundo tempo.

Tirei essa foto no apito inicial. Era para ilustrar a nossa salvação. Não teve clima.

Revoltado rasguei a arquibancada atrás do gol da Paralela e fui esvaziar a bexiga para logo em seguida encher novamente, uma vez que acompanhar um jogo do Vitória tem exigido cada vez mais o consumo do suco de cevada. Voltei para outro ponto da arquibancada, diferente da que costumo ficar (e garanto que foi essa mudança que rompeu a good vibe, me culpem), e foi lá onde as sensações do título deste texto tomaram forma.

Jogo equilibrado, Vitória apertando e deixando espaços. Kanu isola uma bola na cara do gol. Patric raspa a trave de cabeça. André Lima esbarra uma paulada no jovem goleiro Cezar. Cada bola que não entra é a certeza do azar de um time que que não merecia se salvar. E foi com essa certeza que Caique Sá, o Sonic, a grata surpresa, a salvação da lateral direita, me faz uma falta proposital em seu algoz, Vinicius Júnior, próximo da área, num lugar conhecido como “meio gol” para Diego, o cobrador do Flamengo, aos quarenta e seis minutos de tempo final. Podia piorar? Podia. Na cobrança Uilian Correia, sem pai nem mãe, meteu a mão na bola como num bloqueio de voleibol e desgraçou milhões de corações. Pênalti.

Naquele momento eu e metade da arquibancada pulava comemorando o “meio gol” jogado na barreira. Mas aí a ficha caiu. Diego na bola e gol. Flamengo 2×1. Abriu-se a porta do inferno. Mas fechou em seguida. Inexplicavelmente a torcida do Vitória começa a pular e comemorar como se Diego fosse o nosso camisa 10. Eis o desespero.

“Gol da Chape!”
“Gol do Corinthians”
“Acabou o jogo da Chape”
“Caímos”
“Ficamos”

O goleiro Fernando Miguel, visivelmente abatido após o jogo. Reprodução/Youtube

Jogo encerrado no Barradão. Nesse momento, sem entender bulhufas do que acontecia na frente dos meus olhos, fui pego pelos ombros por uma mulher que me perguntava aos prantos: “O que aconteceu?! Caímos? Ficamos?! Me diz alguma coisa!!!”. Eis a incerteza, logo encerrada pelo cântico desesperado de parte da torcida. “Vamo, vamo Chape!!!”. Estava explicado. E eis a humilhação. Fomos salvos com um gol nos acréscimos de Chapecó. Ficamos, mas com as calças na mão. Enquanto uns comemoravam, eu chorava. De raiva, de desgosto, de sofrimento… e eis as lágrimas do alívio.

Chegando ao estacionamento encontro um amigo que chora desesperadamente durante um abraço. Um desabafo de um torcedor desgastado, cansado, desistente diante da repetição de um filme cada vez mais presente na história do clube. Um pai de família que abre mão de muita coisa para viver o dia a dia de um clube de futebol. Era impossível não dividir aquelas lágrimas.

Os refletores das quatro linhas foram apagados em 2017 com a sensação de que nem deveriam ser acesos. E todos os holofotes foram voltados para os bastidores, onde o sofrimento permanece durante a eleição que vai eleger um responsável por nos fazer esquecer essa temporada maldita, ou por querer esquecer de vez os caminhos do Barradão.


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