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Vitória: o nosso bem comum

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Foto: Maurícia da Matta / EC Vitória

Por Daniel Caribé*

O Vitória é um bem comum que vem sendo produzido por uma imensa coletividade há mais de um século. Quando aqueles jovens da elite soteropolitana criaram o decano dos esportes baianos, no final do século XIX e em um país completamente diferente do atual, jamais poderiam ter imaginado que seus nomes seriam eternizados.

Entretanto, nesses mais de cem anos de existência, o Vitória foi apropriado pelas diversas classes sociais, se espalhou para além dos bairros nobres da cidade de Salvador, chegou ao Recôncavo, a todo o estado da Bahia, e agora tem torcedores por todo o país. O Leão, ainda conhecido como “da Barra”, é também da Ribeira, do Cabula, do Nordeste de Amaralina, do Rio Vermelho, da Boca do Rio, de Mussurunga, do Curuzu, do Subúrbio, de Cachoeira, de Brasília e de Aracaju. É de homens e de mulheres, da antiga e da nova geração, tem a torcida mais negra do país, fixou residência e construiu uma nova identidade em Canabrava. É por isso que o nosso “mito de fundação” não está na nossa origem, mas na nossa transformação.

Diretores, conselheiros, sócios e atletas das mais diversas modalidades esportivas, inclusive muitas mulheres e muitos negros, tiveram um papel fundamental na criação desse bem comum que chamamos carinhosamente de Nêgo. Porém foi cada abraço dado, cada comemoração feita e cada lágrima derramada pelos milhões de torcedores anônimos que vestiram e ainda vestem as nossas cores desde o final do século XIX até o início deste século XXI, desde as arquibancadas do Campo da Graça até as do Barradão, passando pela ainda nossa Fonte Nova, que nos colocou em um lugar especial na história dos esportes brasileiros e consolidou uma das mais importantes instituições da Bahia e de Salvador.

Porém esse bem comum anda muito maltratado e precisa agora ser resgatado, cuidado, atualizado e ampliado. A gestão dos esportes de hoje exige profissionalismo e, para além disso, uma instituição como é o nosso clube, situada na periferia do capitalismo, precisa ser mantida e zelada por uma imensa coletividade para poder existir em um mundo globalizado e competitivo. O que funcionou em outros tempos já não funciona mais, e quem outrora pôde ser chamado de vanguarda hoje nada mais é do que retrocesso.

Entendemos o apego daqueles que não querem largar o osso, pois também amamos o Vitória. Talvez seja a nossa maior obra, algo que deixaremos para as próximas gerações independentemente de termos marcado o gol do título, contratado algum ídolo, construído um novo centro de treinamentos ou emprestado o nome para batizar o nosso estádio. Cada torcedor, sócio ou não, sabe que ajudou a fazer do nosso clube o que ele é e sente que é responsável por não deixá-lo se acabar.

É nesse embalo que há alguns anos a torcida vem lutando pela profissionalização, pela democratização e pelo reconhecimento do caráter popular do clube. Movimentos como o Somos Mais Vitória, o Vitória Livre e a Frente Vitória Popular, cada um a seu momento, foram fundamentais para consolidar a ideia de modernização do nosso bem comum e trazê-lo, aos trancos e barrancos, para os dias de hoje.

Esses movimentos surgem após a nossa queda para a 3a Divisão pela primeira (e tomara que última!) vez, provocada pelo sujeito que hoje reocupa o posto de presidente. Sabíamos que ali um ciclo tinha se encerrado e um novo estava surgindo. Entre acertos e erros, entre conquistas e boicotes, o Vitória se tornou um clube maior, pois a torcida se tornou protagonista.

Entretanto, como tudo que é jovem, a democracia no Vitória tem muito a aprender. Em um momento de desespero provocado pelas consecutivas gestões vergonhosas e suspeitas, a torcida do Leão entrou no clima do populismo que tomou conta do Brasil. Movida pelo mesmo afeto que elegeu Bolsonaro, também elegeu o nosso incompetente e autoritário presidente. É verdade, hoje nos arrependemos, brasileiros e rubro-negros, mas ainda precisamos corrigir os nossos equívocos e recolocar o Brasil e o Vitória nos rumos.

O “novo” presidente do decano dos esportes baianos veio para destruir todos os avanços conseguidos nos últimos anos: acabou com o futebol feminino, desvalorizou a divisão de base, envergonha o clube com escândalos e chiliques cotidianamente, agride os torcedores, briga com a imprensa, promete acabar com a democracia e transformar o clube em empresa (de novo!), não presta contas e acha que pode fazer o que quiser com o nosso patrimônio.

Mas que fique registrado em nossas memórias: ele não faz isso sozinho! Foi eleito com o apoio de todos os inimigos do caráter popular da nossa torcida e está sendo blindado pelo Conselho Fiscal e pelo presidente do Conselho Deliberativo. Como se fosse um grande ato final desse drama que se tornou o Vitória, todos os “abnegados” e autoproclamados donos do clube se juntaram apenas para serem derrotados de forma definitiva.

Essa forma definitiva de derrotá-los se chama INTERVENÇÃO NO VITÓRIA JÁ! Precisamos urgentemente destituir o Conselho Fiscal e instaurar uma auditoria independente, para assim saber o que vem sendo feito do nosso patrimônio. Precisamos também responsabilizar e punir todos que são culpados por nos deixar nesta situação, desde os últimos presidentes do clube até os que hoje são inimigos da transparência e da prestação de contas. E, acima de qualquer coisa, precisamos reconvocar logo após o fim da pandemia a Assembleia Geral Extraordinária de sócios que foi arbitrariamente cancelada pelo Conselho Deliberativo, em uma nítida manobra ilegal e antidemocrática, para assim reformar o nosso estatuto social e instituir regras mais modernas de gestão, participação e controle.

Se quisermos continuar existindo, se quisermos continuar produzindo por mais um século esse bem comum que se chama Esporte Clube Vitória, então é hora de superarmos a apatia e as nossas diferenças e nos apropriarmos do nosso clube em definitivo, sem deixar espaço para déspotas e retrógrados. Exija #IntervencaoNoVitoriaJa!

*Daniel Caribé é torcedor de arquibancada desde sempre, conselheiro eleito pela Frente Vitória Popular, administrador público, mestre em Administração e doutor em Arquitetura e Urbanismo.

Fala, Rubro-Negro! é uma coluna de opinião da torcida. Seu conteúdo é de responsabilidade dos signatários e não necessariamente é o que pensa o Arena Rubro-Negra.


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