No último domingo, em vez de dar atenção ao time que até conseguiu encarar de frente o São Paulo no Barradão, me perdi em reflexões profundas sobre o atual momento do nosso Santuário. E a reflexão começou quando notei, ao fundo do prédio administrativo, que o antigo e memorável arbusto com o nome do clube não existira há algum tempo. Foi lembrar dele e vieram em mente recordações maravilhosas.
Continuei perdido. Voltei rapidamente ao campo principal, atraído por um cruzamento de Nino no jogo, mas logo retomei a reflexão. Tentei continuar de onde parei, mas meus olhos focaram nas estruturas improvisadas para os cinegrafistas e suas câmeras no prédio central. Mais abaixo a posição ridícula em que colocaram os bancos de reservas – visando utilizar espaço do gramado novo para os treinamentos semanais. De repente, gol do São Paulo.
Saí do jogo chateado, mas nada que já não seja frequente. Caminhei pela escuridão da Av. Artêmio Valente até o novo estacionamento, murado, asfaltado, mas, como as ruas de entorno, ainda sem iluminação eficiente. Preso no congestionamento ouvi de um amigo: “Mário, quando sai a via expressa?”. Sorri expressando minha total interrogação para a pergunta. Dei a volta e em vez de Canabrava arrisquei ir pela Estrada Velha/Trobogy. Mostrei ao brother por onde ela vai passar e disse: prometeram começar em fevereiro.
Em casa, mais calmo e acompanhado da minha cervejinha, fiquei refletindo em como o Barradão está estagnado. Abri no computador a foto do projeto de Fernanda Almeida, da Arena Barradão, e a foto ao lado, do modesto estádio recém inaugurado em 1986. Com certeza vocês terão a mesma conclusão que eu tive se questionarem: qual a realidade mais próxima?
Em meados dos anos 70, quando parte da aristocracia soteropolitana mexeu os seus pauzinhos para tentar empurrar para cima o clube de futebol da cidade que inflamava seus corações, não existia a possibilidade de que quase 40 anos depois aquele sonho ainda estaria em construção. Na época, o prefeito Clériston Andrade e os governadores Antonio Carlos Magalhães e João Durval Carneiro acreditavam que o terreno e o dinheiro doado ao Esporte Clube Vitória para a construção da primeira (e até então única) praça esportiva particular do estado da Bahia, devolveriam ao time o prestígio de outrora. (Veja os gols do primeiro jogo do Leão no Barradão, contra o Santos em 1986)
Paulo Carneiro, decano gestor do clube, deu prosseguimento ao sonho. Alguns me chamarão de saudosista, viúva, o que quer que seja, mas ninguém será capaz de negar que não se derreteu ao ver o projeto da Arena Multiuso que seria construída no terreno do Wet’n Wild. Só o Atlético-PR tinha uma desse tipo no Brasil. Mas se for para ostentar o título de viúva, que seja para lembrar que foi com PC que o modesto Barradão se transformou em um complexo esportivo, batizado de Benedito Dourado Luz. Os campos do CT Manoel Pontes Tanajura, a Chácara Vidigal Guimarães, a iluminação do campo principal, o plano de sócio torcedor… foram muitos avanços.
Já é de uma audácia imensa da minha parte defender os feitos de alguém que é odiado pela grande maioria dos rubro-negros, mas eu vou além. Vou voltar novamente aos anos 70 e lembrar que Antônio Carlos Magalhães, então prefeito soteropolitano e posteriormente governador da Bahia, ao planejar construir novas avenidas na cidade, também planejou o que poderia existir nas margens para que elas fossem viáveis, rentáveis. E foi assim que em 1975 o Shopping Iguatemi nasceu bem em frente a nova rodoviária (1974), na junção de duas grandes e novas vias, a Paralela e a ACM.
Não entendo o porquê, mas pessoas autoritárias e cheias de defeitos como ACM e Paulo Carneiro costumam ter boas ideias. Quem duvida que se PC fosse o presidente hoje a modernização do Santuário ocorreria ao mesmo tempo que a construção da via expressa, e as duas seriam concluídas juntas, reduzindo as distâncias dos sonhos de todo torcedor rubro-negro? Quem duvida que a pressão sobre os responsáveis pelas obras não seria pauta semanal na imprensa?
Detesto decepcioná-los, mas com isso eu não defendo o retorno de Paulo Carneiro. Na verdade como um bom rubro-negro eu sonho com uma diretoria audaciosa e responsável, corajosa e equilibrada. Essa gestão dos sonhos já teria fechado um contrato com uma construtora e o novo Barradão já estaria em construção. Enquanto isso o Vitória estaria aproveitando os mesmos benefícios que o rival goza na Fonte Nova, tendo inclusive jogadores pagos pelo consórcio administrador.
Aliás eu esperava que pelo menos a gestão atual fizesse pressão no governo estadual para que as obras que beneficiam o clube fossem aceleradas. Era o mínimo para um grupo que tem no Vitória uma porção de conselheiros e gestores. Mas nem isso. Em sucessivas entrevistas ao Arena Rubro-Negra o atual presidente Carlos Falcão preferiu desconversar e focar nos serviços de trânsito e transporte da prefeitura (de oposição ao governo).
Enfim, esse era para ser o texto comemorativo aos 28 anos de construção do Estádio Manoel Barradas, completos nesse 11 de novembro de 2014, mas abriu espaço às críticas. Para ser sincero, quem como eu frequenta todo santo jogo no Santuário também não lá do que comemorar. O Barradão é o maior título presente na história do Vitória, a paixão eterna de todo torcedor e está carente de respeito. Refletindo permaneço à espera de um milagre e saudoso suponho ao concluir: seria bom replantar o arbusto.
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