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A corneta nem sempre salva

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Toda torcida tem lá seus torcedores corneteiros, mas, vamos combinar, parece que no Vitória o número é maior. Não somos uma platéia que se ilude com qualquer papinho, que faz festa para tudo, que apóia o clube quando, digamos assim, ele não merece… Pelo contrário, sempre fomos conhecidos por sermos críticos, alcunha que devemos ostentar com muito orgulho: somos racionais e isso é massa. Ocorre que nem sempre a corneta salva, como dizem. Muito pelo contrário.

Assim como os brasileiros em geral, nós, rubro-negros, somos imediatistas. Queremos ver resultados e muitas vezes não conseguimos compreender que no futebol, assim como em outras áreas da vida, há coisas que demandam tempo. A alta rotatividade aliada à ansiedade da torcida está em todo canto e pode ter influência na atual situação do clube.

Explico.       

A impaciência com jogadores, técnicos e até com o presidente não permite que haja a implementação de um projeto e sua continuidade, seja de jogo, seja de gestão. E é um círculo vicioso. Como nenhum técnico se mantém no cargo e muitas vezes não há uma alinhamento do perfil do profissional contratado com a identidade do clube, cada um que entra traz seus jogadores de confiança e “sugere” outros nomes, impondo suas idéias e características. Com isso, há demissões e novas contratações. Não deu certo em alguns meses? Muda o técnico, lógico! E o ciclo se renova. Nem o presidente está a salvo dessa impaciência: sem os resultados em campo, o gestor é o próximo alvo.

A título de exemplo, no último semestre, nada mais, nada menos que 60 jogadores (pasmem!) entraram em campo pelo Vitória. Um total de 31 reforços (?) foram trazidos e 18 atletas foram embora. Os números assustam.

Técnicos? Tivemos três no mesmo período. Chamusca ficou três meses, Tencati apenas dois e já há quem peça a cabeça de Loss. Nem deveria ter vindo? Talvez. Teve tempo para impor a sua proposta de jogo? Com certeza não.

Para finalizar os números, vamos aos mais estarrecedores. Estamos no sexto presidente em cinco anos (desde 2014, sucederam-se Falcão, Raimundo Viana, Ivã, Agenor, Ricardo David e Paulo Carneiro). Não tenho provas, mas tenho convicção de que, nessa toada, não há clube que resista.

Torcedores, calma

Com isso, não ouso dizer que a culpa é da torcida (jamais!), afinal a caneta não está em nossas mãos, mas é preciso que sejamos mais pacientes. Este imediatismo não é bom, nem para o time, nem para as finanças do clube.

Primeiro, porque é necessário tempo para que haja continuidade em qualquer projeto: é preciso horas de treino para que seja implementada a proposta do técnico, bem como para o devido entrosamento entre os atletas. Para resolver essa questão, seria muito interessante que o DNA do clube fosse mais respeitado pelos gestores. Termos um padrão desde a base ajudaria muito na transição e nas contratações em geral, seja de técnico, seja de jogadores. Não buscaríamos no mercado peças aleatórias ao bel prazer do treinador ou mesmo do diretor de futebol, mas profissionais que se enquadrem no padrão de jogo do Esporte Clube Vitória. Isso já evitaria as flutuações de que falamos acima.

Ainda há a repercussão financeira deste troca-troca. Vejamos os jogadores formados no clube, por exemplo. Continuamos sendo um celeiro de craques que brilham enquanto jogam nas categorias de base, mas quando têm oportunidade de atuar pelo profissional, por vezes não encontram a necessária benevolência da torcida, salvo exceções quando o talento é óbvio. Fora os atletas que se contundem com freqüência (temos algum problema na preparação física visando a transição, isso é fato), outros tantos são vendidos a preço de banana ou dispensados, entregues de bandeja, pois “não servem para jogar no Vitória”, embora tenham um desempenho superior em outros clubes. Por que será? Será que não somos excessivamente críticos com nossas jóias? Eles são nosso patrimônio, oras. Temos todo o interesse em que joguem bem e se desenvolvam, nos trazendo alegrias enquanto estiverem por aqui e rendimentos quando saírem.

De modo semelhante ocorre com os demais jogadores. Não os compramos, obtivemos por empréstimo ou trocamos por outros atletas nossos? Quantos queimamos por aqui, eles saíram e tiveram um melhor destino em outro clube? Claro que não é tão simples e essa questão precisa ser analisada mais profundamente (corneteiros místicos dão conta que se trata da água do Barradão), mas não é óbvio que vender jogador antes do fim do contrato tem implicações financeiras, como multas que o clube deve arcar, processos judiciais, etc, que interferem nas contas da agremiação e atrapalham o seu progresso?

Se analisarmos os treinadores, já tivemos três só este ano. Por mais que tenham sido contratações duvidosas (não precisa ser corneteiro para saber que foram apostas), o que mais preocupa é que se tratam de profissionais com idéias de jogo bem diferentes e portanto as trocas implicaram em uma quebra na continuidade da qual já falamos. Qual é o momento limite para pedir a cabeça do técnico? Não é difícil perceber que se a escolha for ruim, não há tempo que resolva, mas mesmo um bom treinador, para que se mostre longevo e não mero apagador de incêndios, não precisa de um certo tempo para impor suas idéias e para que os jogadores a internalizem?

Com o presidente é a mesma coisa. Por mais que não tenhamos votado e não acreditemos nas idéias de um ou de outro, uma vez eleito, precisamos democraticamente aceitar a derrota e não permitir golpes a nossa jovem democracia que possibilitem a sua deposição em tempo inferior ao previsto. O gestor precisa de um prazo mínimo para conseguir por em prática o projeto apresentado em campanha. Críticas construtivas sempre faremos, afinal não há quem ame mais o clube que seu torcedor, e mecanismos de controle e fiscalização podem e devem ser implementados, mas este assunto fica para outro dia.

Vamos ter paciência?


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