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Entenda os processos judiciais envolvendo Paulo Carneiro e o Vitória

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O presidente do Esporte Clube Vitória, Paulo Carneiro, está sendo investigado por uma comissão especial do Conselho Deliberativo por conta de processos judiciais de autoria do dirigente contra a empresa Vitória Sociedade Anônima, criada por ele mesmo no fim da década de 1990.

A motivação para a investigação vem de uma recente movimentação na polêmica ação judicial movida por Paulo Carneiro em 2007, onde cobra da Vitória S/A uma indenização trabalhista no valor de 800 mil reais. O processo foi novamente movimentado em 2020, quando estava prestes a ser arquivado. O curioso é que Paulo Carneiro é, atualmente, presidente afastado da empresa, que estava adormecida e foi reativada durante sua atual gestão no EC Vitória. 

Esse é mais um capítulo da longa história envolvendo o dirigente, a justiça e o Vitória. Para entender todo o contexto precisamos voltar para 1998, quando iniciou-se o processo de criação da Vitória S/A.

O Vitória S/A

Em 1998, Paulo Carneiro, que presidia o Esporte Clube Vitória há aproximadamente sete anos, tornou público seu interesse em transformar a agremiação em clube-empresa, a fim de abrir o capital do rubro-negro a investidores. No entanto, limitado pelo estatuto do clube que impedia a operação em sua totalidade, foi criado o Vitória S/A, sociedade anônima que faria, em resumo, a gestão do futebol do Esporte Clube Vitória. 

Assim, no ano 2000, o Vitória S/A adquiriu 51% do Esporte Clube Vitória por 6 milhões de dólares, investidos pelo Grupo Excel, que passara a administrar todos os ativos do clube – jogadores, direitos de transmissão e até o próprio Barradão –  e tendo Paulo Carneiro como diretor representante do clube.

Time campeão da Copa do Nordeste, em 1997, já tinha o patrocínio da Excel

Só que o namoro durou pouco. Em 2001, devido à crise financeira na Argentina, o Grupo Excel anunciou o interesse de sair do mercado brasileiro de futebol para investir em outros negócios – eles também encerraram a parceria com a equipe argentina Quilmes. Mas a concretização da saída ocorreu mesmo em 2004, quando, em uma operação questionável, o Exxel conseguiu vender os seus 51%  de participação no Vitória S/A para o próprio Esporte Clube Vitória. 

Essa operação custou caro ao clube. Apesar das negociações girarem em torno de 500 mil dólares na época, segundo Paulo Carneiro, houve ainda um acordo onde o EC Vitória pagaria um montante de US$ 7,5 milhões divididos em 60 parcelas. Naquele mesmo ano, 2004, era rebaixado à Série B do Brasileirão, e, ano seguinte, à Série C, situação que levou à renúncia de Paulo Carneiro do comando do clube.

Os novos dirigentes trataram de desvincular o Vitória S/A  do Esporte Clube Vitória, fechando a sociedade anônima no ano de 2010, após a quitação das dívidas de compra.

O primeiro processo

Em 2007, dois anos após deixar o Vitória, Paulo Carneiro ajuizou uma ação contra o clube alegando direitos trabalhistas como férias e FGTS no período entre 2000 a 2004, quando foi diretor do Vitória S/A. O argumento do mandatário foi que “com a queda do time à terceira divisão, foi alvo dos mais diversos achincalhes, vindo a renunciar em outubro de 2005”  e de que “seu contrato foi alterado à revelia, com redução salarial e remuneração paga ‘por fora’, inclusive um bônus de US$ 1,2 milhão.”

Mas o processo não caminhou pois ele não possuía vínculo empregatício com o clube. Para exercer o cargo de diretor, Paulo Carneiro foi eleito em assembleia com os acionistas do Grupo Excel, secretários do Vitória S/A, jurídico e conselheiros deliberativos do EC Vitoria, na época, sendo assim, um diretor estatutário, sem direito à remuneração fixa mensal.

Gol sofrido em derrota para o Santo André em campanha vexatória na Série B de 2005. Foto: Fernando Pilatos/Gazeta Press

O cartola chegou a apresentar documentos que comprovariam a existência de um contrato entre ele e o clube, porém o mesmo foi rejeitado pela juíza Viviane Tanures, sob alegação de que o documento “possuía vício de falsidade ideológica” pois parecia um documento “preenchido em formulário padrão (geralmente encontrado em livrarias)”. Ela finalizou seu veredito afirmando que “o autor àquela época já exercia a Presidência do Esporte Clube Vitória, bem como do Vitória S.A.”. Paulo perdeu e teve que pagar 5 mil reais pelas custas processuais. 

Mas não desistiu. Tentou um novo recurso, pedindo que se analisasse a possibilidade de responsabilizar o Esporte Clube Vitória como devedor solidário. Também requereu o benefício da Justiça gratuita, alegando “se tratar de pessoa pobre e não poder arcar com o pagamento das custas”. Novamente perdeu e teve que desembolsar mais R$ 2,5 mil. Pra piorar, ele havia pedido que o processo corresse em segredo de justiça, o que também foi negado.

Totalizando os pedidos de revisões trabalhistas e de danos morais – onde o dirigente alegou ter sofrido “achincalhamentos  e campanhas difamatórias” após sua saída, Paulo Carneiro chegou a requerer uma quantia de 10 milhões de reais do clube, ao tempo em que se apresentava como diretor de futebol do arquirrival rubro-negro, o Esporte Clube Bahia.

O segundo processo

Derrotado na primeira tentativa, Paulo Carneiro voltou à justiça em 2010, alegando uma dívida de 820 mil reais do Vitória S/A com sua empresa, a Carneiro Assessoria Financeira Ltda. Essa empresa, que tem entre os sócios-fundadores o próprio Paulo Carneiro e sua ex-esposa Giovânia Pereira, tinha sido contratada para prestar serviços ao Vitória S/A 2004 e 2005.

A contratação ocorreu em nome da sócia da empresa e, além da sua assinatura, teve também as de Walter Seijo e Jorge Valderrama, ambos representando o Vitória S/A. De acordo com o contrato, o clube-empresa deveria pagar mensalmente a quantia de R$ 40,5 mil à Carneiro Assessoria Financeira Ltda, o que, de acordo com a referida, não ocorreu. 

Foi este processo que foi resgatado graças às movimentações recentes. Esta ação sofreu movimentação judicial em julho de 2020, mais de dois anos após decisão proferida pela juíza Fernanda Marinho da Silva Godinho, da 11ª vara cível de Salvador, em 14 de dezembro de 2017.

Impedido de ser candidato, Paulo Carneiro apoia Manoel Matos nas eleições de 2017. Foto: Marcelo Góis / Arena Rubro-Negra

Nela, a magistrada acusa Paulo Carneiro de ter forjado o contrato para se beneficiar do clube. “”Em sede de contestação a parte ré arguiu incidente de falsidade afirmando que se trata de um pseudo contrato. Ressalta que a autora jamais prestou qualquer serviço ao acionado. Esclarece que o Sr. Paulo Carneiro, então presidente do clube, forjou o contrato para propiciar o recebimento de valores ‘por fora’, já que não foram assegurados pelo Conselho de Administração do acionado”, diz trecho da decisão da juíza.  “Verifica-se assim que o contrato firmado entre as partes foi realizado com o intuito de simular uma relação jurídica que de fato não existiu, apenas para recebimento de valores superiores àqueles que foram assegurados ao presidente estatutariamente pela sociedade a que presidia. […] Assim, evidenciada a simulação, impõe-se, por consequência a decretação da nulidade do ato jurídico simulado, devendo as partes retornar ao status quo ante”, aponta outra parte da sentença.”

A defesa de Paulo Carneiro reagiu em 6 de julho de 2020, alegando “oportuno apontar que a maioria dos clubes de futebol do Brasil adotam a presente estratégia, contratando-se em parte ou totalmente os serviços desenvolvidos por profissionais do futebol, através de empresa com autorização do profissional para tanto”. 

Caso não houvesse tal manifestação, o processo seria arquivado por ausência de movimentação.

A Resposta

Paulo Carneiro, através do site oficial do clube, emitiu um comunicado para se defender “de fatos falsamente alardeados nas redes sociais… Dando a entender que eu estaria aproveitando a minha condição no Clube para resolver a questão.”. Sendo assim, afirmou que apenas o “advogado constituído, por conduta própria, manifestando-se em decorrência da determinação judicial, APENAS interpôs embargos declaratórios, buscando que a sentença se tornasse mais clara”.


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