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Mais que um clube: o Vitória, o esporte e a reconstrução de vidas

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Juliana Tourinho

No decorrer da última semana o Twitter foi tomado por uma polêmica (aliás, como sempre) devido a uma declaração associando determinado tipo de profissão a um clube. Não quero me alongar em algo extremamente simples: fala infeliz, sou “defensora dos queijinhos” porque torcedor é torcedor e ponto final. Mas o gancho que quero aproveitar aqui é outro; como alguns rebateram a tal fala (ou tal tweet) com declarações depreciando o Vitória, a torcida, o Barradão, etc. Leiam novamente o que escrevi: alguns, não todos, porque não posso combater a generalização de uma torcida com mais generalização. Chegamos então ao ponto crucial de toda essa enrolação: será que o rapaz que começou esse quiproquó conhece o papel do Esporte Clube Vitória dentro de Canabrava e agora, como nossa irmã mais nova, de Cajazeiras?

Meu pensamento imediato (além do óbvio, repudiar a tal fala) foi nas diversas formas que o Vitória se insere na sociedade. Pensei no quanto o clube é identificado com diversos esportes olímpicos (futevôlei, futsal, Handebol, Taekwondo, Vôlei, Vôlei de Praia, Judô, Natação e Remo). Pensei no futebol feminino – bem verdade que ainda estamos engatinhando, mas que não foi criado por uma regra condicionante a participação em competições. Pensei no basquete, esporte que me atinge diretamente, pois foi através do Vitória que comecei a acompanhar e me interessar. Deus sabe o quanto é difícil ser atleta nesse país, ainda mais fora do futebol e certamente o perfil predominante não é de pessoas de alto poder aquisitivo.

Algumas das dezenas de crianças que alimentam o sonho de serem jogadores de futebol. Foto: Diogo Lima / Arena Rubro-Negra

Sinto um orgulho absurdo de ver a transformação que o estádio criou naquele bairro, através da geração de empregos no clube, no pessoal das barracas da nossa amada Faixa de Gaza ou nas “tias” do isopor. Já caminhei por cima de muito lixo para sentar em arquibancada mal construída e digo isso com muito orgulho, pois o sentimento de valorização de cada pedacinho de concreto que está ali não cabe em mim. Sinto o mesmo no que se refere ao projeto do Vitória Cidadania, que permite a 300 crianças o contato direto com o esporte, sendo obrigatório ser aluno de escola pública em turno alternado ao da atividade desejada e preferencialmente morador da região. Tenho consciência que a Avenida Mário Sérgio já era parte dos planos do governo para o sistema viário da região, mas a presença do Manoel Barradas e a demanda dos torcedores por melhorias no acesso acabam contribuindo para que o projeto tenha sido colocado em prática o quanto antes – nós utilizaremos 1 ou 2 vezes por semana por algumas horas, a população utilizará infinitamente mais.

Foto: Francisco Galvão/ EC Vitória

E Cajazeiras (para os íntimos, Cajacity), que virou nossa caçulinha. Quem vai a um jogo logo vê a recíproca no amor entre o clube e esse bairro incrível, que abraçou o projeto do basquete rubro-negro. A quantidade de fotos solicitadas ao fim de cada jogo, as crianças que entram uniformizadas para brincar na quadra, cada pequeno gesto me faz ter certeza de que não poderia existir lugar melhor para estarmos. O clube poderia ter escolhido jogar em outros locais, mas Cajazeiras foi uma escolha certeira por criar uma forte identidade em tão pouco tempo, seguindo os passos de Canabrava há 30 anos. Em tempo: o ingresso é 1kg de alimento não perecível, repassado a instituições pela Universo/Vitória e pela própria administração do ginásio.

Isso tudo que falei é para tentar ilustrar o quanto o clube atua para que a identificação com sua torcida não se limite ao estádio. Nós queremos mais do que o futebol: queremos cativar a criança pelo esporte, queremos ser vistos como o agente transformador de bairros, queremos que a mera menção a nossa marca seja motivo de orgulho. Mais do que ter torcida em bairros periféricos conseguimos, ainda que às vezes indiretamente, ajudar a preencher lacunas abertas pelo poder público.

Vejam bem, não quero criar um cenário lindo e perfeito no qual não há defeitos ou oportunidades de melhoria. Muito menos criar uma competição ou semear ainda mais discórdia afinal o mundo precisa é de mais amor e respeito. Só me senti extremamente incomodada porque além de discordar da fala sempre me orgulhei muito da proximidade do clube com Canabrava e a sociedade através dos projetos como os acima citados.

As formas de aproximar o torcedor do clube, independente de gênero, profissão, classe social é um desafio que merece muito debate. Mas isso é assunto pra outra conversa…

Juliana Tourinho é engenheira e sócia Sou Mais Vitória.


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